Texto extraído do livro
"CAMINHANDO COM JESUS".
Da Série A Palavra na
Vida 182/183
de Carlos Mesters e
Mercedes Lopes.
Publicação CEBI.
Mais
informações em vendas@cebi.org.br
SITUANDO
Jesus vai
tentando abrir a mentalidade dos discípulos e do povo para além da visão
tradicional. Na multiplicação dos pães, ele tinha insistido na partilha (Mc
6,30-44). Na discussão sobre o puro e o impuro, tinha declarado puros todos os
alimentos (Mc 7,1-23). No episódio da mulher cananéia, ele ultrapassa as
fronteiras do território nacional e acolhe uma mulher estrangeira que não era
do povo e com a qual era proibido conversar. Estas iniciativas de Jesus,
nascidas da sua experiência de Deus como Pai, eram estranhas para a mentalidade
do povo da época. Cresce para eles o mistério, aparece o não-entender.
A abertura
crescente de Jesus era uma ajuda muito importante para as comunidades do tempo
de Marcos. Elas eram um grupo pequeno, perdido naquele mundo hostil do Império
Romano. Quando um grupo é minoria, sofre a tentação de se fechar sobre si
mesmo. A atitude de abertura de Jesus era um estímulo para as comunidades não
se fecharem, mas manterem bem viva a consciência missionária de anunciar a Boa
Nova de Deus a todos os povos, como Jesus tinha pedido com tanta insistência.
Marcos 7,
31-36: Abrir o ouvido e soltar a língua
O episódio da
cura do surdo-mudo é pouco conhecido. Jesus está atravessando a região da
Decápole. Decápole significa, literalmente, Dez Cidades. Era uma região de dez
cidades ao sudeste da Galiléia, cuja população era pagã. Um surdo-mudo é levado
a Jesus. O jeito de curar é diferente. O povo queria que Jesus apenas impusesse
as mãos sobre ele. Mas Jesus foi muito além do pedido. Ele levou o homem para
longe da multidão, colocou os dedos nas orelhas e com saliva tocou na língua,
olhou para o céu, fez um suspiro profundo e disse: "Éffata!", isto é,
"Abra-se!" No mesmo instante, os ouvidos do surdo se abriram, a língua
se desprendeu e o homem começou a falar corretamente. Jesus quer que o povo
abra o ouvido e solte a língua! Todo o povo ficou muito admirado e dizia:
"Ele fez bem todas as coisas!" (Mc 7,37). Esta afirmação do povo faz
lembrar a criação, onde se diz: "Deus viu que tudo era muito bom!"
(Gn 1,31).
Marcos 7, 37:
Jesus não quer publicidade
Ele proibiu a
divulgação da cura, mas não adiantou. Quem teve experiência de Jesus vai contar
para os outros, queira ou não queira! As pessoas que assistiram à cura
começaram a proclamar o que tinham visto e resumiram a Boa Notícia assim:
"Ele fez bem todas as coisas".
ALARGANDO
Abertura para
os pagãos no Evangelho de Marcos
Na época do
AT, na rivalidade entre os povos, um povo costumava chamar o outro de
"cachorro" (1Sm 17,43). Isto fazia parte da relação conflituosa que
eles tinham entre si, na terra de Canaã, para formar um povo novo com direito à
terra, à vida e à identidade própria. O enfrentamento entre Golias, o gigante filisteu,
e Davi, o pastorzinho israelita, é uma amostra desta situação. Para Davi,
vencer o filisteu pagão era salvar a honra tanto do povo israelita como do Deus
vivo (1Sm 17,26). Quando Davi se aproxima para a luta sem as armas
tradicionais, mas apenas com um bastão, Golias pergunta: "Será que sou um
cachorro?" (1Sm 17,43).
Ao longo das
páginas do Evangelho de Marcos, há uma abertura crescente em direção aos outros
povos. Assim, Marcos leva os leitores e as leitoras a abrir-se, aos poucos,
para a realidade do mundo ao redor e a superar os preconceitos que impediam a
convivência pacífica entre os povos. Eis exemplos:
A mulher que
Marcos nos apresenta era uma pagã, siro-fenícia de nascimento (Mc 7,26). No
passado, nos tempos da rainha Jezabel e do profeta Elias, tinha havido
rivalidade entre Israel e o povo da Fenícia ou de Canaã. Mas agora, a
mulher não está preocupada com as rivalidades do passado. Ela busca a
libertação para a sua filha, dominada por um demônio (Mc 7,26). Ouve falar de
um judeu que tem o poder de Deus para libertar do mal. Aqui, já não importam os
preconceitos raciais. O que importa é a vida ameaçada da filha, vida oprimida
que precisa ser libertada.
Na sua passagem pela Decápole, região pagã, Jesus atende ao pedido do povo do lugar e cura um surdo-mudo. Ele não tem medo de contaminar-se com a impureza de um pagão, pois, ao curá-lo, toca-lhe os ouvidos e a língua. Enquanto as autoridades dos judeus e os próprios discípulos têm dificuldades de escutar e entender, um pagão que era surdo-mudo passa a ouvir e a falar pelo toque de Jesus. Lembra o cântico do servo: O Senhor Iahweh abriu-me os ouvidos e eu não fui rebelde (Is 50,4-5).
Ao expulsar
os vendedores do templo, Jesus critica o comércio injusto e afirma que o templo
deve ser casa de oração para todos os povos (Mc 11,17). Fazendo assim, ele
resgata a profecia de Isaías que estendia a salvação aos estrangeiros e manda
abolir as restrições da lei que proibia a participação de eunucos, bastardos e
estrangeiros na assembleia de Iahweh (Dt 23,2-9).
Na parábola
dos vinhateiros homicidas, Marcos faz alusão ao fato de que a mensagem será
tirada do povo eleito, os judeus, e será dada aos outros, aos pagãos (Mc
12,1-12). Depois da morte de Jesus, Marcos apresenta a profissão de fé de um
pagão ao pé da cruz. Ao citar o centurião romano e seu reconhecimento de Jesus
como Filho de Deus, está dizendo que o pagão é mais fiel do que os discípulos e
mais fiel do que os judeus (Mc 15,39).
A abertura
para os pagãos aparece de maneira muito clara na ordem final dada por Jesus aos
discípulos, depois da sua ressurreição: Ide por todo o mundo, proclamai o
Evangelho a toda criatura (Mc 16,15).
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.