Neste ano, o evangelho
oferecido para refletir nesta festa da Ascensão é o de Lucas, que é, sem
dúvida, quem mais explicita esta ideia tanto no final do terceiro evangelho
como no início do livro dos Atos dos Apóstolos.
Ele também é o único que narra
o acontecimento do ocultamento da ascensão, da desaparição visível de Cristo no
céu, quarenta dias depois da Ressurreição.
Para os outros evangelistas,
como para Paulo, a ascensão é um acontecimento invisível e em conexão imediata
com a ressurreição. Tanto é assim que até o século V depois de Cristo, a
Igreja, apesar do texto lucano, celebrou como festa única a Páscoa e a
Ascensão.
Depois sim, se fez sentir a
historificação da narrativa de Lucas e se desmembrou a festa da Ascensão como
festa própria.
Cabe a pergunta sobre o porquê
do texto lucano, se de fato acreditamos que o acontecimento pascal abraça num
único mistério a paixão, a morte, a ressurreição, a ascensão e o envio do
Espírito Santo.
Sem dúvida, Lucas busca
explicitar aos seus destinatários o mistério de Jesus e a missão da nova comunidade.
Para isso ele usa um estilo
literário, uma linguagem própria de sua época. Cenas de ocultamento e de
ascensão não eram desconhecidas no mundo antigo greco-romano e judeu.
Narrações desse estilo eram
usadas para realçar o final glorioso de um homem, se descreve uma cena com
espectadores, a pessoa famosa dirige as últimas palavras ao povo, ou aos seus
discípulos, e nesse momento é arrebatado ao céu. E a sua ascensão se descreve
entre nuvens e obscuridade, para caracterizar sua numinosidade e transcendência.
Segundo Paul Ricoeur, Lucas
faz uso de um esquema narrativo que estava à sua disposição naquele tempo, para
comunicar o mistério pascal.
Lucas narra que Jesus foi
elevado ao céu, revelando assim seu destino e glória, a comunhão com Deus; dele
saiu, a Ele volta. Quantas vezes no evangelho de João encontramos Jesus
anunciando que volta ao Pai de quem veio!
A comunidade primitiva
reconhece a glória de Jesus, que é a vitória definitiva do Deus da vida sobre a
morte, por isso se prostram e adoram-no.
É significativo Lucas dizer
que os discípulos voltam para Jerusalém. Sabemos que esta cidade é muito
querida pelo evangelista, nela ele concentra os acontecimentos principais da
vida de Jesus, ali também se dará início a um tempo novo, o tempo da Igreja
nascente.
Até podemos fazer um
paralelismo entre dos textos lucanos que fazem referência a esta cidade.
Foi em Jerusalém onde Jesus
ainda menino foi apresentado no Templo (Lc 2,32), e a Igreja também será
"apresentada" nesta cidade, e a partir dela continuará a missão de
seu Mestre e Senhor (Lc 24,47).
O texto de hoje ainda revela
uma característica muito importante da comunidade primitiva: a alegria. No meio
da fragilidade, perigos e incertezas, que viviam como pequeno grupo nascente
estão alegres.
A alegria é fruto da presença
do Ressuscitado no meio deles, que os encoraja a não ficar parados, fechados no
cenáculo, mas a comunicar essa alegria a todos/as como Jesus o fez.
Por isso a Igreja é, desde sua
origem, missionária. A missionariedade é parte da natureza da Igreja, não uma
atividade mais.
Segundo o teólogo
francés Marie Dominque Chenu a Igreja precisa a anunciar com sua
vida o anúncio do profeta Sofonias que coloca na boca de Javé estas
palavras: "Me enamorei de vocês, e quero vir a viver com vocês: então, dançarei
de alegria". Se a instituição é necessária, também com a sua
dimensão política, segundo a lógica própria da encarnação, então ela não será
outra coisa que um serviço, um conjunto de "ministérios".
Compreender e realizar essa
missão nos dias de hoje é o grande desafio de toda a Igreja.
Referências
BOFF, Leonardo. Hablemos de la outra vida.
Barcelona: Sal Terae, 1978.
DUFOUR, Xavier Leon. Ressurrección de Jesus y mensaje
Pascual. Barcelona: Sigueme, 1972
KONINGS, Johan. Espírito e Mensagem da liturgia
dominical. Porto Alegre: Escola Superior de Teologia, 1981.
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