No início do tempo comum, a Igreja nos oferece uns dos
textos mais bonitos do evangelho de João.
Depois da passagem de Jesus pelo deserto, do encontro com
o Batista e seus primeiros discípulos, o evangelista nos conduz a uma festa de
casamento em Caná de Galiléia, uma simples aldeia, situada a uns 10 km. de
Nazaré, rodeada de pequenas colinas cobertas de oliveiras.
Fazendo uso de nossa imaginação, podemos recriar este dia
de festa e alegria no qual Jesus participava como convidado com sua mãe e
amigos.
Para os novos discípulos de Jesus que tinham vivido com o
Batista anteriormente, era sem dúvida contrastante estar com seu novo Mestre
numa festa de casamento!
João Batista vivia e pregava no deserto, vestia peles de
camelo e comia gafanhotos e mel silvestre (Mc 1, 6). Suas palavras revelavam um
Deus irado e exigente (Mt 3,7-10).
Agora a imagem de Jesus é totalmente diferente: é um
Messias que partilha sorridente as alegrias do povo.
Desta maneira, o evangelista, desde o início da vida
pública de Jesus, mostra o essencial que Ele veio nos revelar, uma nova imagem
de Deus!
Não é o Deus temível do Batista, não é o Deus preso à lei
dos fariseus (simbolizado nos potes de pedra), o Deus que Jesus revela é um
Deus alegre, simples, terno, que celebra a vida.
Pensemos quantas perguntas passariam pela cabeça dos
discípulos e discípulas de Jesus, que eram de tradição judaica, alguns
seguidores do Batista.
Eles nos ensinam qual é a atitude principal de um/a
discípulo/a, permanecer junto com o Mestre, estar com Ele, segui-Lo, mesmo sem
compreender tudo, porque é no caminhar juntos que o vamos conhecendo, sem
conhecê-Lo plenamente.
Entra em cena Maria, trazendo no meio da festa a
necessidade dos noivos: "Eles não têm mais vinho!".
Que necessidades Maria sinalizaria hoje, na festa da
vida: "Eles não têm o que comer", "Eles trabalham como
escravos", "Eles não têm moradia digna", "Eles não
encontram sentido para sua vida"...
Cada um/a de nós pode se sensibilizar e solidarizar com
Maria olhando para a realidade na qual vivemos, e como ela apresentá-la a
Jesus. Que diríamos para Ele?
Maria espera que seu Filho atue, confia nele, guarda em
seu coração as palavras do Anjo: "Eis que você terá um filho, e dará a ele
o nome de Jesus. Ele será grande, e será chamado Filho do Altíssimo" (Lc
1,31-32).
Ela simboliza todos aqueles que, em Israel, esperam a
realização das promessas messiânicas. Representa aqueles que conscientes da
realidade aguardam algo novo, não só não se conformam senão querem e esperam
algo mais!
E aqui o evangelista nos mostra uma característica
nova de Jesus. Ele se deixa tocar e comover pelo sofrimento dos outros. Ele se
apresenta como um Deus sensível e próximo. Que diferente do Deus inacessível e
intocável dos fariseus e sacerdotes da Lei!
Jesus não age sozinho, precisa da comunidade para fazer
acontecer o novo: "Jesus disse aos que serviam: «Encham de água esses
potes»".
Os potes de pedra serviam para a purificação dos judeus,
segundo a sua tradição. O evangelista disse que eram seis, representando neles
o Antigo Testamento, a Antiga Aliança.
Mas eles já nos servem mais, ao transformar a água em
vinho, Jesus inaugura um tempo novo, uma nova festa caracterizada pela
generosidade e gratuidade de Deus que a faz possível.
O mestre-sala não sabia de onde vinha o vinho novo,
mas "os que serviam estavam sabendo, pois foram eles que tiraram a
água".
A comunidade representada nos serventes, é testemunha da
ação de Jesus: "Porque a vida se manifestou, nós a vimos, dela damos
testemunho..." (1Jo 1, 2).
O primeiro sinal de Jesus é através do vinho novo, que
permite a festa de casamento acontecer. No final da sua vida, Ele oferecerá de
novo vinho, que é o seu próprio sangue que selará a aliança da humanidade com
Deus para sempre.
Neste texto, o evangelista nos apresenta já o projeto de
vida nova que Jesus traz, fazer acontecer a verdadeira festa da vida em
abundância, na qual todos/as somos convidados/as a ser ativos /as
protagonistas.
A mesa está pronta, o banquete servido, o vinho
oferecido, e o povo em aliança com Deus, caminha solidário com a humanidade
sofrida na busca de continuar fazer a festa acontecer.
Referências
BROWN, Raymond. La Comunidad del discípulo
amado. Salamanca: Sígueme, 1983.
KONINGS, Johan. Espírito e Mensagem da liturgia
dominical. Porto Alegre: Escola Superior de Teologia, 1981.
SHUSAKU, Endo. Jesus. Santander: Sal Terrae,
1973.
SUSIN, Luiz Carlos. Jesus Filho de Deus e Filho de
Maria. São Paulo: Paulinas, 1997.
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